"Um país só pode ser considerado culturalmente desenvolvido se ele tem uma alta produção e também uma alta compreensão dessa produção".
Ana Mae Barbosa
A frase citada nos remete à ideia de equilíbrio. O mesmo conceito norteador dos povos orientais, o mesmo que outras civilizações buscam nas mais diversas áreas – até mesmo no âmbito pessoal. O equilíbrio traz a sensação de conformidade. A educadora ressalta exatamente esse ponto – a maturidade cultural de uma nação é avaliada pela quantidade, qualidade e compreensão do produto cultural. Por quem entrega e por quem recebe.
Referência na área, Ana Mae é a primeira doutora em arte-educação do Brasil e foi uma das precursoras da sistematização do ensino de Arte em museus. Autora da “Proposta Triangular”¹ que, em uma definição resumida, trabalha o entendimento das ações básicas que estão ligadas ao modo de processamento do conhecimento em arte. Ações mentais e sensoriais para efetivamente formar o apreciador e fruidor da arte. A Proposta Triangular gira em torno dos três eixos: a leitura da obra de arte, o fazer artístico e a contextualização – ver/fazer/contextualizar, não necessariamente nesta ordem.
Em entrevista concedida a Revista Continente, em maio de 2008, retoma a ligação da proporcionalidade entre produção e compreensão no efetivo desenvolvimento cultural.
"Porque o que a gente tem no Brasil hoje é um fenômeno curioso: uma alta produção de arte. O Ministério da Cultura deu enorme importância à produção, fomentou-a. O programa Pontos de Cultura foi uma das melhores ideias que já ocorreu a um governante no Brasil, mas é principalmente voltado para a produção. Acontece que um país só pode ser considerado de alta cultura quando você tem a produção e a recepção dessa produção também ativa, viva, crítica. Está faltando educar a recepção. Você só educa a recepção através do ver arte, do fazer, da contextualização. Eu acho fundamental essa tríade para se conhecer arte – fazer, ver e contextualizar. Contextualizar o que você faz e o que você vê."
Para alguns estudiosos e profissionais da área, esse educar a recepção é inaceitável, mas é ponto comum a preocupação com a dispersão da informação. O desperdício, o que não se consolida e, muito menos, se transforma ou avança. Pensando em ações culturais, das políticas aos projetos, a energia e a força do trabalho despendidas visam o quê realmente? Visam o “mais um” que nada deixa, ou “o passo além” que, certeiro, vai facilitar outro passo, e outro e outro...
As novas mídias e equipamentos tecnológicos são partes importantes dessa construção, quando as ações buscam alcançar não só volume, em suma – números. Mas principalmente continuidade e aderência do conhecimento, do acontecimento. E mesmo para um espaço cultural, que busca a visitação constante traduzida em números, quais seriam as ações fomentadoras do hábito. Seria algo assim: disseminar a vontade, que causa prazer, que resulta em hábito.
Pense no alcance, na credibilidade conferida ao comentário de um desconhecido, também poderia ser de um amigo; ou, contrapondo, ao de um crítico, das cadeirinhas e aplausos já tão manjados dos grandes jornais e revistas especializadas... O que causa este frisson com relação aos milionésimos acessos – aí poderia ser a um post, um vídeo ou um perfil. Resposta: a espontaneidade. Ela tende a influenciar e a causar um real interesse no que está sendo dito.
Além desta realidade, síntese das possibilidades oferecidas pelas mídias sociais – expressivas² e colaborativas³, somamos o avanço tecnológico. Os aparelhos, os aplicativos, tudo isso facilita, agiliza, possibilita interação e o uso permanente da imagem e do som. A imagem e som contidos no ver/fazer/contextualizar de Ana Mae. Como poderia esse mix colaborar com a compreensão da arte? O seu receptor talvez não espere o uso das mídias para a reprise da síntese do release que você já disparou para os diversos canais. Também não quer ver você usando o espaço como mais um para a divulgação da agenda. É o espaço do sutil, da verdade, da troca e do simples. Está muito relacionado com nossos instintos básicos. Tem essa força porque acompanhou a evolução intelectual que modificou as necessidades e anseios das pessoas Pense nisso no próximo projeto.
¹ Entre os acadêmicos, há uma vertente que entende a Proposta Triangular (originalmente tratada como Metodologia Triangular pela educadora em seu livro lançado em 1991) como uma adaptação do DBAE (Discipline-Based Art Education), um projeto americano financiado pela Getty Foundation em 1960. Ana Mae defende a Proposta Triangular como um contraponto aos conceitos do DBAE.
² Mídia Social Expressiva quando expressamos opiniões ou explanamos assuntos.
Ex: blogs, microblogs (twitter), redes sociais (Orkut, Facebook, LinkedIn, MySpace, Google+), eventos (Lista Amiga, Upcoming), compartilhamento de fotos (Flickr, Picasa), de vídeo (Vimeo, Youtube), de música (Blaving, imeem).
³ Mídia Social Colaborativa quando os usuários colaboram com a manutenção, produção do conteúdo.
Ex:Wikis (wikipedia), Social bookmark, Social News/crowdsourcing/crowdfunding , sites de opiniões (Epinions).
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